sábado, 16 de julho de 2016

Lamentos IV

Um dia acordei e tudo ficou escuro.

Tudo tão escuro que eu pensei que eu tivesse...
Saído deste mundo pra ir pra longe
Que eu nunca mais iria encontrar o caminho de casa
Encontrei a morte tantas vezes que fiquei até sem assunto
E vi tantos morrerem junto comigo,
Que eu quase tive vontade de voltar pro começo de tudo

E eu lembro que tinha alguém, que tinha alguns, que tinha tantos
Eu vi as portas sendo fechadas, as janelas seladas, os momentos...
Morrendo tão cruelmente, tão sufocante, tão doloridos,
Que pensei que aquilo fosse o fim de tudo
E foi
Uma página que já não cabia mais palavra alguma, à ser virada

E passou tudo tão devagar e rápido, que deu para se viver tanto
Eu sentei com os suicidas, bebi com eles, entendi eles, neguei eles...
Rodei por tantos becos, ruas, bares, espetáculos, que já sabia tudo decor
Eu vivi tantos sonhos que acabei realizando todos os pesadelos juntos
Conheci os senhores, os reis, os súditos, os vassalos do mundo
Entendei que se morre de fome, de frio, de falta de ar... De amor

E aquilo girou tão rapidamente devagar, que eu me perdi
Eu vi a vida nua como ela é apresentada quando se cresce
Eu dancei com a morte mais algumas vezes até ela dizer bem de perto
"Se você se move, é porque ainda está vivo"
E aquela era a verdade que mais me corroía ao longo dos dias
Eu ainda estava vivo, mesmo que respirando fuligem

Eu ouvi vozes de todos os lados dizendo pra sair dali
Que meu tempo por aqueles cantos havia acabado,
Que eu havia aprendido tudo que eu deveria
Que era hora de voltar ir para outro lugar melhor
Pra onde o caminho continuava difícil do mesmo jeito
Mas onde eu deveria colocar tudo aquilo que fora aprendendo

E de cima eu consegui olhar para trás, todos aqueles séculos
Ver que só haviam se passado exatos 365 dias da minha morte
Que tudo tinha mudado de uma forma tão absurda que eu...
Fiquei tão perdido no que eu era, no que eu fui, no que eu quero
Que eu olho somente para meu sangue que recém coagulado
E digo com um sorriso quase que infanto... Eu ainda estou vivo

segunda-feira, 4 de julho de 2016

Miopia

Miopia é um problema sério
Clinico, oftalmo, disfuncional, GRAVE

Tem quem tenha miopia leve
Esse faz de conta que não enxerga bem
Quando precisa, até vê o que quer
Mas se inventa de não querer ver...
"Maldita seja essa dita"

Ás vezes dá em um olho só
Tem quem seja dos dois também
Não enxerga um palmo à frente
Quem dirá enxergar o próximo
"Desculpe, quase não enxergo"

Como dito no primeiro dito
É GRAVE
Principalmente quando a miopia espalha
Tipo câncer
Vai descendo pela garganta...
Chega no pulmão...
Se aloja no coração

Ah meu amigo
Quando chega neste estágio
O sujeito já não enxerga o próprio reflexo
Não vê o mundo, não enxerga o óbvio
E até inventa que anda vendo tudo
Consegue até julgar o "borrão" que ta vendo
"Se fulano fosse assim ou assado..."

Para curar a miopia "do olho"
Tem até cirurgia
Daquelas com doutor, anestesia e tudo mais
Mas pra curar a miopia "da alma"
Essa dá trabalho...

Precisa de ter vontade de ir além de ver
Talvez até mesmo fechar os olhos
Pra olhar além dos vãos dos dedos
Da própria vida que se vive em vão
Pra finalmente enxergar o teu irmão




terça-feira, 29 de março de 2016

De Lua

Não tinha sol
Não tinha nuvem
Nem barulho na rua
Só tinha ela
Que por horas só olhava pra cima
"Ta olhando pra onde moça?"
Mas quem disse que ela respondia
"Ta olhando se vai chover?
E a lua só tomava conta do mesmo céu que ela olhava
"Me diz que eu to impaciente pra saber o que tanto vc olha"
Ela se virou e apenas sorriu
Voltou a olhar a lua agora
"Não tem nada la em cima, só a lua, as estrelas, planetas e nada mais"
A verdade é que ele tava errado
No céu não tinha só isso
Tinha tudo isso
E mais ela, inteira, de corpo e alma
Envolta junto as estrelas, os planetas e a lua
Que ele não via
Mas que sorriam pra ela toda noite

segunda-feira, 7 de março de 2016

Como Falar de Uma Mulher?

“Como pode um homem falar de uma mulher?”
Ousadia minha, peço licença
Não vou entrando...
Não posso
Não devo!

A mísera falha do homem em tentar falar de uma senhoria
Das mulheres de Atena de Chico, até os poemas Bukowskianos
São meras tentativas
Um pouco falhas
Nos desculpem a grosseria, estamos aprendendo ainda.

Então como falar do que não se sabe?
Poderia ficar horas descrevendo os abusos sofridos
Os salários mal pagos, das ingratidões dentro dos lares
Do medo de sair na rua, do medo de não sair na rua.
Do querer apenas a igualdade, sem discriminação alguma.

Da violência que sangra ou daquela que deixa marcada a alma
Dos séculos de submissão, dos desejos que foram reprimidos
Dos sonhos que foram cortados antes mesmo de nascerem
Das noites amamentando, dos julgamentos por nunca ter amamentado
De ter que ser aquela, esta, a outra, parecida, diferente, de ter que ser tanto.


Não consegui... Falhei miseravelmente como todos os outros homens
Pra falar de uma mulher eu não deixo escolhas se não deixar quieto
E que elas mesmas falem delas, que finalmente possam falar delas
Deixem que elas falem delas, por favor, não interrompam o falar delas
Apenas escutem, aprendam, e principalmente, respeitem elas.


sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Alguém...?

São tantos fatos pra se pensar
As memórias que bombardeiam
Os bombardeiros que desaguam
A fome que não passa
E a contínua retórica apenas persiste em cada ato
Alguém escuta?

E tudo fica escuro ou claro de repente
Em uma questão de 24 horas
Tudo passa girando, rodopiando, arrepiando
Se vão carros, pessoas, vidas, amores...tudo
Sem pena ou consenso, descanso...pedido?
Alguém vê?

É como uma confusão, mental ou física
Planar ou fora dos planos, ajuizada ou...não
É a vontade de olhar pra trás e tentar ver algo
Até conseguir encontrar, as vezes é possível
Mas não se prenda a isso, não mesmo, “feche os olhos”...ok?
Alguém sente?

E amanheceu de novo, parece até mentira
Mas é verdade, olhe a janela, entra luz
Um pouco, um único filete sobre seus pés
Já basta, já é suficiente, dá para sonhar com isso, sabia?
Consegue dar um passo agora? Isso, faz bem
Alguém?

Aquelas perguntas egoístas...
Alguém mais sente? Vê? Escuta? Alguém?
E sim, todos, na mesma frequência, em coros diferentes
Existe sim o fim de tudo isso, não é longe, nem perto
É certo, entre o ponto cego da razão e o da loucura
Alguém estará lá sim...

domingo, 17 de janeiro de 2016

Cacos

Se existe algo que aprendi nestes últimos versos
É que somos divididos em milhares de pedaços
Talvez exatamente para que ao fim de tudo
Pudéssemos pegar cada um deles e nos reavaliar

Em cada pedaço é como se pudéssemos nos ver
Nos ver em partes pequenas e que geralmente não vemos
Partes que só vemos quando derrubadas ao chão,
Quando fazem barulho ao cair

Imagine como um espelho quebrado em milhares de cacos
Feitos exatamente para quando nos abaixássemos para limpar
Pudéssemos nos enxergar em milhares de faces diferentes
Milhares de seres vagando em um único maior


E nesta reunião dos milhares de “eu”
Os pedaços se juntam novamente, prontos
Imediatamente preparados para caírem novamente
Dar inicio a nova quebra e ao novo levante